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58º Osterio

Osteria dell’Angolo

Com Pedro Paulo Teixeira, Secretário-Chefe da Casa Civil da prefeitura do Rio de Janeiro e José Marcelo Zacchi, colaborador e pesquisador do IETS.

Temos um núcleo qualificado, mas não temos gestão metropolitana, e não temos um rebatimento dessa qualificação na gestão local, decentralizada, de bairro. Isso é um problema. Avançamos setorialmente [...] Criamos mecanismos de planejamento, de transparência, de acompanhamento, de prestação de contas, mas temos muito que avançar em participação e participação descentralizada na ponta nesses processos. Avançamos com essa visão com o plano estratégico. Mas temos ainda dificuldade de rebater isso no território. Por ultimo, e não menos importante, a pauta da desigualdade [...] quando a gente avançar e rebate no território, certamente isso virá para o primeiro plano, veremos quais padrões de assimetria que temos na cidade, e como superá-las.
José Marcelo Zacchi

O avanço que o Plano Estratégico representa para a cidade do Rio de Janeiro deixa mais claro os problemas que ainda enfrentamos.

A cidade possui um Plano Diretor, elaborado pela Câmara Municipal. Mesmo assim, a prefeitura achou importante traçar seus próprios Planos - um no começo do mandato, e outro agora, oito meses antes do fim.

O exercício até facilita o debate eleitoral. Pode-se fazer avaliações, tanto em termos do acerto de prioridades quanto em termos de cumprimento de metas. No debate do OsteRio, houve grande admiração pelo que a prefeitura já conseguiu fazer, e críticas sobre o método pouco democrático pelo qual os Planos foram elaborados.

O Secretário -Chefe da Casa Civil, Pedro Paulo Teixeira, explicou na apresentação dele que um Plano Estratégico da prefeitura não é meramente uma referência, mas é concebido para ser utilizado em conjunto com ferramentas de gestão, com metas- é para o dia a dia. A Casa Civil coordena o plano, a diferença de outras casas civis, para planejar, modernizar a gestão, buscar as melhores práticas, fazer incubação de projetos, e combinar parcerias com o setor privado.

"Hoje em dia, projetamos o PIB da cidade em quase R$ 200 bilhões," disse ele. "A cidade tem investimento próprio, já contratado, no valor de R$ 10 bilhões. Contando com a iniciativa privada, no âmbito de cinco parcerias públicas privadas -lixo, no aterro sanitário de Seropédica, o Parque Olímpico, o Porto, a Transolímpica, e saneamento na zona Oeste— o Rio de Janeiro tem hoje mais R$10 bilhões investidos."

Com a soma dos dois, de R$20 bilhões, a cidade hoje tem investimentos totalizando 10% do PIB dela.

De acordo com o secretário, em três anos e meio atingiu-se 80% das 46 metas de 36 iniciativas estratégicas do Plano de 2009, lançado apenas oito meses depois da posse do prefeito. Existe um painel de controle de cada um desses 36 projetos, e há mecanismos permanentes de acompanhamento.

Toda segunda-feira às sete horas, os secretários se reunem com o prefeito, para acompanhar o plano. De três em três meses acontece uma reunião de gerenciamento, durante um sábado inteiro.

Para a concretização dos elementos no plano, foi necessário criar uma cultura nos cem mil servidores públicos, de que "esse documento é o documento mãe", lembrou Teixeira. Para tanto, a prefeitura lançou mão de um sistema de meritocracia, utilizando bonificações de até dois salários, pagos no meio do ano. Dos cem mil, 83 mil podem ganhar essas bonificações; a Comlurb está fora, mas logo será contemplada também.

Em 2012, decidiu-se por uma revisão do plano de 2009, desta vez com maior participação. Formou-se um Conselho Estratégico, com 200 participantes, "pessoas com conhecimentos específicos e história de realização na cidade", conforme o secretário explicou.

A McKinsey trabalhou nos dois planos. Houve reuniões, entrevistas, e uma pesquisa de opinião do IBOPE. Levou-se em conta experiências em Londres, Dubai, e de outras cidades. Houve uma pesquisa orçamentária. O novo plano conta com 56 metas e 58 iniciativas estratégicas. O custo é de R$ 30 bilhões, dos quais 30% virão de fontes externas tais como o governo federal, as PPPs, e concessões ao setor privado.

Do total, 70% dos investimentos estão concentrados nas zonas Norte e Oeste, seguindo um padrão já estabelecido pelo primeiro plano. Os investimentos incluem infraestrutura, transporte e habitação, entre outros. O plano também dá continuidade à ênfase em saúde da família. De acordo com o Secretário, ao início da posse do prefeito Eduardo Paes, existia uma cobertura de apenas 3,5% das famílias -ou seja, 200 mil pessoas— em termos de atenção primária. Hoje esse número é dois milhões, chegando a 35% do total de famílias em 2012.

O novo plano estabelece uma meta de 70% de cobertura de saúde primária até 2016. A meta é um meio termo, pois 50% da população tem plano de saúde, mas uma parte -talvez 20%— desse grupo possui planos "precários" conforme disse o Secretário, sendo que a prefeitura pretende então oferecer saúde pública para quem está nessa situação.
Hoje o Rio de Janeiro possui a maior concessão de saneamento do país, para cuidar da zona Oeste. Metade da cidade, ou um terço da população — 1,8 milhão de pessoas— tem uma taxa de saneamento de 4%. O contrato com o grupo Águas do Brasil e a Foz do Brasil prevê uma taxa de saneamento nessa região de 40% até 2016, porém o plano vai mais longe, prevendo cobertura de 50%.

Na área de educação, uma das metas mais importantes, entre um total de cinco, é o ensino integral, de sete horas por dia.

Entre as metas urbanísticas existe o objetivo de desenvolver, através de uma concessão, a Cidade Nova, seguindo o padrão do que está sendo feito na região do porto. Também, com a resolução da questão do lixão do Gramacho, agora parte-se para a meta de coleta seletiva de 25% dos recicláveis até 2016 com um mínimo de separação, o que representa 40% de todo o lixo. Na área do transporte, existe a conclusão das "Trans", os corredores BRT. Hoje, 16% das pessoas buscam transporte público ; a meta agora é de crescer até 2016 para 60%.

"Isso é uma revolução," disse Teixiera. "São quase 155 quilômetros de BRTs. Muda também a logística das empresas, muda o mercado imobiliário."

Ao comentar a apresentação do Secretário, José Marcelo Zacchi lembrou que a mera existência do Plano já é um fato para se comemorar. Representa, diz ele, a "recuperação da capacidade de ação da prefeitura", pois os grandes desafios que se apresentavam no começo do mandato do prefeito Eduardo Paes demandavam muita reflexão e planejamento.

Zacchi também comentou que, com mais de 20% de seus moradores em favelas, o Rio de Janeiro começa a contar com um tripé virtuoso de segurança, investimento em urbanização e expansão de serviços públicos, e que talvez esse tripé não esteja muito explícito no Plano.

Ele também mencionou as questões do dinamismo econômico das áreas que estão sendo integradas à cidade formal; o papel da juventude na agenda da cidade, e a sustentabilidade dos compromissos sociais com toda a cidade. O Rio expande em direção ao Oeste, mas ainda há muito por fazer no Centro e na zona Norte. Como conter essa expansão? Políticas de território não estão evidentes no Plano, ele disse. O Plano inclui focos no Porto, na Cidade Nova, na área da avenida Brasil, e na Transbrasil, em termos de incentivos à moradia e reocupação econômica, mas não explicita prioridade e metas nesse sentido, Zacchi comentou.

O Plano trata, ele acrescentou, das vocações da cidade para 2030 basicamente do mesmo jeito que elas já existem hoje. Há menções de vocação para o turismo e para a economia criativa, mas essas vocações não permeiam o plano, faltando-lhes maior explicitação. Economia criativa é mais do que cultura, ele lembrou, e deve incluir também a tecnologia. A vocação na área de petróleo e gás está muito mais sedimentada do que as outras no Plano.

O plano também não trata de questões de sustentabilidade ambiental de forma orgânica.

Para iniciar o debate geral, Manuel Thedim comentou que o Plano não trata da governança, em termos da região metropolitana e da baia de Guanabara.

Diz o Secretário que a política social não faz diferença entre o morro e o asfalto. Pensa-se um novo modelo de educação infantil para toda a cidade. A saúde da família tem tido mais investimento na Zona Oeste, mais necessitada; as 150 Escolas do Amanhã pensam isso, o cartão Família Carioca já chega a 100 mil famílias, ou 530 mil pessoas, e já se vê uma melhora nas notas dos filhos nessas famílias.

A questão da região metropolitana, ele lembrou, é primordial. Nossa região metropolitana é a maior do país; talvez seja preciso a liderança do governo do Estado.

David Zylberstajn comentou que no Japão que ele viu um planejamento de cem anos, e que isso faz sentido mesmo. Ele fez parte do Conselho, e ficou espantado pela qualidade das pessoas. A prefeitura tem a credibilidade necessária para incentivar a participação, o que não teria sido o caso na administração anterior. No Conselho, não se falou orçamento, nem houve promessas de que tudo que o Conselho decidisse seria feito. A prefeitura tem a palavra final. Zylberstajn também faz parte do conselho do Rio Como Vamos, e se diz surpreendido pelo fato do prefeito atual não apenas ter assinado um compromisso de indicadores no qual a ONG pediu a assinatura de todos os candidatos em 2008; mas que ele "pega os indicadores e cobra aos secretários".

José Luis Alqueres, que faz parte de três conselhos que visam a cidade do Rio de Janeiro, lembrou que a limpeza das finanças da cidade foi fundamental, além do planejamento e gestão que se vê hoje no Rio. A territorialização ainda é um discurso, ele acrescentou, de cima de baixo, em vez de ser de baixo para cima-do bairro para cima. Lembrou da duplicação da avenida Niemeyer, da conexão da rua Humberto de Campos com a rua Redentor, e da praças Nossa Senhora da Paz e General Osório como exemplos de intervenções onde os moradores não estão sendo ouvidos.

José Arnaldo Rossi fez sugestão de radicalizar na integração do território, de construir uma representação de território de baixo para cima, e de incluir a distribuição de renda no plano, pois a desigualdade é um desafio óbvio. Também sugeriu o abandono da questão de sustentabilidade ("que não quer dizer nada!"), para pensar consumo e reciclagem como se a cidade fosse o corpo humano, conforme os japoneses estão fazendo.

Paulo Magalhães perguntou como se pensa governança numa cidade onde existem interesses em conflito. "Quero saber da democracia desse plano. Quais são os mecanismos efetivos de participação popular, passiveis de transformar esse plano efetivo num plano público, coletivo, com respaldo popular e grande legitimidade?" ele também perguntou.

Tereza Lobo, presidente do Rio Como Vamos, comentou que a mortalidade infantil é diferente em Copacabana e Bangu porque os serviços são diferentes. Queria também saber quando as políticas de governo irão de tornar políticas de estado.

Vários participantes falaram do saneamento. "Há valas negras perto das cinquenta escolas onde eu trabalho," disse Yvone Bezerra de Mello. "Não vejo movimento."

Aos que perguntaram sobre a participação popular no Plano, Teixeira respondeu dizendo que não é sempre fácil espacializar os indicadores e os investimentos, e que a ONG Rio Como Vamos cobrou muito isso, na elaboração do plano. Faltam dados [na semana seguinte ao debate, anunciou-se a intenção de fazer do Instituto Pereira Passos uma espécie de IBGE municipal]. Ele espera ter mais participação das comunidades em revisões do plano no futuro. Levantou a possibilidade de, ao pensar nas vocações da cidade, fomentar a recuperação de indústrias tradicionais, como a farmacêutica, em Jacarepaguá.

Teixeira lembrou que nos últimos cinco anos, o Rio de Janeiro cresceu "tudo o que não cresceu nos últimos trinta anos". Reconheceu a dificuldade de construir legitimidade pela representação. Comentou que a central de atendimento 1746 está começando a trazer dados para a prefeitura, e que ela pode ser uma ferramenta de comunicação de duas mãos. Pela central, a prefeitura ficou sabendo de um surto de construção civil na zona Norte, pois os pedidos de remoção de entulho cresceram muito. Também, em função dos pedidos para limpeza urbana em Bangu e Campo Grande, a Comlurb comprou mais equipamentos. "São três milhoes de pessoas falando com a cidade," comemorou o Secretário.

O programa OsteRio - sempre às segundas-feiras - é uma iniciativa do IETS, da Osteria Dell’ Angolo e da Ligth