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As premissas básicas da construção de políticas públicas para a cidade: liberalismo ou intervencionismo?

Noite 1 - dia 30 de julho de 2012 com o embaixador e ex ministro da economia Marcílio Marques Moreira e Rodrigo Constantino, economista, articulista e blogueiro, mediados pela advogada e economista, Elena Landau, que liderou a privatização durante o governo FHC.

Hoje, para resolver os entraves de políticas públicas, o governo brasileiro envereda pelo caminho das concessões -eufemismo, diz a oposição, para aquilo que o governo FHC praticou nos anos 1990, com o intuito de agilizar setores até então engessados pelo poder público.

Até para tirar o governo do mercado, ele mesmo precisa agir. Mas quanto, como, onde e quando? São questões pouco debatidas no Brasil, onde a ideologia costuma dividir palanques com interesses.

O economista e cientista político Mauricio Blanco, pesquisador do IETS, lembrou na primeira das duas noites de debate sobre o assunto que essa divisão atualmente constitui um nó na evolução da democracia, de maneira geral. Recomendou a leitura do livro Demosclerosis: The Silent Killer of American Government [Demosclerose: o matador silencioso de governo americano], de Jonathan Rauch.

Interesses particulares aparte, os expoentes nesses dois debates explicitaram suas formações e posições.

O embaixador Marcílio Marques Moreira contou um pouco da inusitada infância e juventude, passados em Viena, Budapeste e Berna, além do Rio de Janeiro-antes e durante a Segunda Guerra. Viu de perto na Europa a censura aos livros e a intolerância. "Foi a semente da repulsa," disse.

Para ele, um liberal possui uma crítica metodológica, é um reformador (não um conservador), é contra o totalitarismo, e entende que o estado e o mercado se completam. Preza a dignidade da pessoa humana, é contra soluções imediatistas, e acredita que a liberdade se baseia em responsabilidades. "As leis são para o bem comum!" Marques Moreira lembrou, apontando os números casos de descontinuidade de políticas públicas, quando as mesmas são capturadas por interesses específicos.

O Rio de Janeiro conhece bem demais a descontinuidade; o próprio embaixador presidiu uma tentativa de tratar a questão das favelas cariocas nos anos 1960, com a criação da Vila Kennedy e a Cidade de Deus.

Elena Landau lembrou que o saudoso diplomata, economista e político Roberto Campos dizia que o liberalismo passou mais longe do Brasil do que Plutão da Terra. Na opinião dela, não há nada de neoliberalismo no Brasil. É que o Brasil é extremamente coletivista, nunca responsabilizando o indivíduo pelos seus atos, preferindo culpar a sociedade como um todo. "As falhas de mercado costumam ser agravadas pelas falhas do governo," disse.

Enquanto o neoliberalismo padece de mal entendidos, o embaixador sugeriu que o debate ideológico esteja marcado por outras falhas humanas. Lembrou ele que, conforme dizia Max Weber, o capitalismo costuma ser confundido com ganância, e que devia-se ensinar aos cidadãos no kindergarten da história cultural que é melhor abandonar esse ideia simplista do capitalismo.

Landau criticou o modelo brasileiro que torna um senador do nordeste mais poderoso do que seu par do rico sul, e que requer alinhamento entre os três níveis de governo, para que se possa criar e implementar as políticas públicas. "É difícil o Cabral brigar com a Presidência," ela disse. "Precisa de um bom governo, não de um governo alinhado."
Ela conhece bem os meandros da política brasileira, tendo sido fundadora do PT, para depois se filiar ao PSDB, tão bem impressionada que ficou com Mário Covas. Hoje não está filiada a partido nenhum, mas sugere que os cidadãos comecem a fazer ações populares contra diversas políticas, tais como a religião nas escolas.

Rodrigo Constantino trouxe o debate para o nível prático, com exemplos de políticas públicas calcadas no liberalismo. Mencionou a necessidade para títulos de terra nas favelas com UPP, seguindo a teoria do peruano Hernando de Soto. Falou dos vouchers para a educação, propostos pelo economista Milton Friedman; e da necessidade de passar para o setor privado as tarefas de desenvolver o turismo no Rio, especialmente no caso dos aeroportos. Na área do SUS, ele propôs uma reformulação. "O liberal é totalmente contra a tutela," proclamou.

Na hora de perguntas e comentários, a candidata a prefeito Aspásia Camargo propôs o tombamento do embaixador Marques Moreira (!), e lembrou que a economia carioca tem longa história de tutelagem. "Qual é a economia possível nessa cidade?" perguntou.

Ela notou que, na maioria das vezes, o petróleo leva ao autoritarismo, e que assim pode ser perigoso para o Rio de Janeiro.

Elena Landau comentou que caira "por acaso" na privatização, tendo que aturar comparações com a Margaret Thatcher (além de ser tachada por machistas de "musa da privatização"). Sobre a mesma, Marques Moreira lembrou de um comentário da ex primeira ministra conservadora sobre o consenso: "Consenso é a falta de comando".

Durante o debate, Elena Landau mencionou o filósofo inglês Michael Oakeshott, autor do livro The Politics of Faith and the Politics of Scepticism [A política da fé e a política do ceticismo]. Nele, o autor diz que a política da fé surge da fé fundamental na capacidade humana para perceber e fomentar o bem universal, ocupando-se de promover políticas para tal. A política do ceticismo surge do ceticismo sobre essa capacidade, e se ocupa de promover políticas que protegem os cidadãos de acontecimentos negativos.

Qual seria a política do Brasil? Será que faz diferença, uma vez que o pendulo das políticas publicas tende a balançar constantemente, do mercado para o estado e de volta para o mercado?